A expectativa do comércio local com as obras do túnel da Sena Madureira
Com base em um projeto antigo, a ideia da Prefeitura é construir dois túneis que vão ligar a região até a Av.Ricardo Jafet, no bairro do Ipiranga. Interessados nos impactos da construção querem maior discussão técnica e pública como Rodrigo Rocha, do Rancho da Empada (na foto), que propõe isenção de IPTU e políticas de compensação de perdas. Em pauta há décadas, a obra do túnel Sena Madureira, em São Paulo, é um dos projetos viários mais polêmicos da cidade. Com a última revisão, a previsão seria construir dois túneis, com pouco menos de 1 mil metros de extensão conectando a avenida Sena Madureira à Avenida Doutor Ricardo Jafet, no Ipiranga - o que deve beneficiar, segundo a Prefeitura de São Paulo, mais de 800 mil pessoas que circulam diariamente na região. O objetivo é desafogar o trânsito intenso da região da Vila Mariana, uma área de transição entre o Centro e a Zona Sul de São Paulo e a região do ABC Paulista. A construção, prevista no Programa de Desenvolvimento do Sistema Viário Estratégico Metropolitano, começou a sair do papel em 2011, durante o governo de Gilberto Kassab, que chegou a contratar a obra, mas foi paralisada. Até que a atual gestão de Ricardo Nunes retomou o projeto e anunciou a construção de dois túneis com duas faixas cada. Segundo a prefeitura, eles seriam dispostos em sentidos contrários, no cruzamento da Rua Sena Madureira com a Rua Domingos de Morais. Há um ano, um canteiro de obras começou a ser montado, algumas árvores foram arrancadas e tratores ocuparam a comunidade Sousa Ramos para desalojar as famílias. No entanto, sua execução enfrenta forte resistência de alguns moradores, ativistas ambientais e movimentos sociais dando sequência ao histórico de paralisações. No momento, as obras enfrentam desafios legais (o Ministério Público já solicitou a paralisação em momentos anteriores). A atualização mais recente ocorreu em 13/10, com o lançamento do edital para licitação para projeto executivo e obra. Em 2025, aconteceram duas audiências públicas sobre o tema, e os grupos pró e contra puderam debater o projeto que tem um custo estimado em R$ 531 milhões. Os principais pontos de conflito giram em torno da remoção de famílias, do corte de árvores e da própria filosofia de priorizar o fluxo de veículos individuais em uma cidade que, teoricamente, busca o transporte público e a mobilidade ativa. Do outro lado, a visão de moradores e empreendedores que buscam o alívio do trânsito da região, e veem essa questão como urgente. Entretanto, apesar da expectativa dos defensores da obra de que ela seja retomada, há também uma preocupação com a condução dessa intervenção. Eles reclamam da falta de espaço no processo participativo; defendem investimentos no viário, assim como em outros modais; indicam que a obra não inviabiliza a construção do previsto corredor de ônibus; demonstram preocupação com os problemas de mobilidade, principalmente ligados aos acessos aos hospitais da região e temem os impactos de possíveis interdições para o comércio. O medo de morrer no canteiro de obras Há 31 anos no endereço, o empresário Rodrigo Rocha, proprietário do Rancho da Empada, é um dos comércios mais antigos da avenida e defende a obra pela necessidade de melhoria na mobilidade da região "que mais sobe torre em São Paulo". Contudo, seu apoio vem com ressalvas baseadas em experiências passadas. O comerciante diz temer que o túnel repita o que ele chama de obras que "mataram o comércio", como as de corredores de ônibus na Domingos de Moraes e na Avenida Santo Amaro. Segundo ele, a principal preocupação dos cerca de 40 negócios instalados na avenida é o impacto de uma interdição prolongada que impeça ou dificulte o acesso de veículos e pedestres aos comércios. Outros problemas normalmente gerados por obras, como calçadas desniveladas, falta de iluminação e lixo acumulado também o preocupam, pois podem afastar os clientes. Além de ajustes técnicos que acelerem e minimizem os impactos da obra, Rodrigo propõe também a isenção de IPTU parcial e uma política de compensação por perdas para não penalizar os empreendimentos que se sacrificarem pelo interesse público. "A obra tem que acontecer, mas não dá para matar o comércio", diz. “Já ouvimos propostas alternativas interessantes nas reuniões e elas não são consideradas, como, acabar com o farol da Sena Madureira com a Domingos de Moraes, usar a área de um posto de gasolina desativado para reduzir o congestionamento sem a necessidade de uma obra tão invasiva. Seja qual for a solução, ela deve ser moderna e considerar a nova realidade da avenida, que não é mais uma via de bairro pequeno, e sim um importante eixo de circulação”. Afirmando não defender a postura rodoviarista, e que entende ser importante fortalecer o transporte público na região, o arquiteto Paulo Maier, superintendente da Distrital Sudeste da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) mora e trabalha na avenida, e contextualiza a realidade da Vila Mariana – que hoje, vive um crescente adensamento de prédios e a concentração de hospitais que exige um fluxo viário que garanta a circulação essencial. "Se não tiver o mínimo de obra viária, vai parar tudo. O que temos aqui (região da Sena Madureira) é uma questão crônica, um trânsito permanente que precisa de solução. A circulação de ambulâncias, e de entregas, especialmente, ficam bem comprometidas" afirma, ressaltando que o túnel pode solucionar boa parte do congestionamento permanente da área. Oswaldo Baccan, presidente da associação dos moradores da Vila Mariana (AVM), diz acompanhar o projeto desde a gestão do ex-prefeito Gilberto Kassab, em 2012, e concorda que o túnel seria importante para desafogar o trânsito, especialmente por ser um ponto de estrangulamento para o fluxo vindo do ABC Paulista. Na expectativa de que a obra seja retomada e seja um benefício para a comunidade, ele reconhece que a questão das árvores e das famílias se tornou o principal entrave. "É um cenário de retomadas e paralisações inesperadas de obras seja por indefinição ou atraso, pois estende o período de dificuldades para os comerciantes, que se sentem impotentes diante da situação". Oswaldo diz que a proposta, que inclui a desapropriação do posto de gasolina desativado, se inspira em ações bem-sucedidas da CET nas décadas de 1990 e 2000, que eliminaram gargalos similares nas ruas Afonso Celso e Luís Góis com a criação de ilhas para pedestres e a Praça Michie Akama. Segundo ele, com o redesenho, além de melhorar o fluxo de veículos, seria possível ampliar a Praça Lasar Segall e instalar novos equipamentos de uso público, beneficiando a comunidade.